O que a ciência já sabe sobre o fenômeno neurológico que transforma a mente materna antes, durante e depois da gestação
Que as mulheres passam por grandes mudanças hormonais que afetam o corpo durante em todo o período gestacional, todos já sabem. Mas o que pouca gente conhece é que essas mudanças também ocorrem numa parte inusitada do corpo: o cérebro.
Esse fenômeno foi descrito em um estudo publicado pela revista Nature Neuroscience em 2024 e foi nomeado como Mom Brain – ou cérebro de mãe -, no qual foram identificadas alterações significativas nas estruturas e funções das mulheres antes, durante e depois do parto.
A descoberta trouxe uma camada extra de especificidade aos estudos sobre neuroplasticidade, área que investiga a capacidade do cérebro de remodelar suas conexões neurais em resposta a experiências e estímulos ao longo da vida.
Como o cérebro materno se modifica na gestação
No estudo, foram realizados 26 exames de ressonância magnética e punção venosa em uma mulher saudável de 38 anos, desde três semanas antes da concepção até dois anos após o parto. Através desse monitoramento, os pesquisadores observaram remodelações em algumas regiões no sistema nervoso central (SNC), tanto em termos estruturais como funcionais.
Uma das principais foi a redução no volume da matéria cinzenta, um conjunto de neurônios localizados no córtex cerebral que também apresentou diminuição em sua espessura. A primeira região é responsável pelo processamento de informações, e a segunda pelo controle sensorial (percepção de estímulos), motor (movimentos voluntários) e por funções cognitivas superiores (pensamento, linguagem e memória).
Em contrapartida, houve o aumento da integridade microestrutural da matéria branca, responsável pela comunicação entre partes distintas do SNC, à medida que a gestação progredia.
Também foi observado um crescimento dos ventrículos laterais, estruturas que armazenam e circulam o líquido cefalorraquidiano (LCR), cujo volume aumentou principalmente no segundo e terceiro trimestres da gravidez, com redução no pós-parto.
Os hormônios também influenciam nessa neuroplasticidade
Essas transformações cerebrais estão profundamente associadas ao aumento de determinados hormônios, que têm uma produção de 100 a 1000 vezes maior na gravidez.
Um dos principais é o estradiol, hormônio esteróide com funções essenciais no metabolismo e nas características sexuais. No terceiro trimestre, seu aumento expressivo contribui para mudanças na massa corporal, retenção de líquidos, no funcionamento do sistema imunológico e no sono.
Os comportamentos criados com essas mudanças
Mas o que tudo isso significa na prática?
A neuroplasticidade durante a gestação está diretamente relacionada à adaptação comportamental da mãe diante dos desafios da maternidade. Ela influencia o vínculo entre mãe e bebê, na preparação para a chegada do filho – conhecido como nesting, em inglês – e as respostas fisiológicas às necessidades emitidas pelo recém-nascido.
Essas modificações dinâmicas indicam que o cérebro materno se adapta de forma equilibrada às novas demandas, quando algumas mudanças permanecem por até dois anos, enquanto outras parecem ser apenas temporárias.
Mais do que uma descoberta científica, o Mom Brain é um indício bastante concreto de como o corpo feminino consegue se reinventar inteiramente para proteger uma nova vida.